Calero cita pressão de Michel Temer
Suposta gravação entregue pelo ex-ministro à Polícia estremece governo, que teme desdobramentos
Brasília. O ex-ministro da Cultura Marcelo Calero disse, em depoimento à Polícia Federal, que o presidente Michel Temer o "enquadrou" para tentar buscar uma saída para o impasse na liberação de um empreendimento imobiliário em Salvador, onde o ministro da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, comprou um apartamento. Na semana passada, ao deixar o cargo, Calero acusou Geddel de "pressioná-lo" para que o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) liberasse a construção.
O depoimento foi encaminhado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) à Procuradoria-Geral da República, que está analisando as informações prestadas à PF para decidir se é necessário solicitar a abertura de uma investigação formal ou se o caso deve ser arquivado. No despacho em que encaminhou o depoimento, a PF pede a abertura de inquérito para apurar o caso.
Aos policiais, Calero disse que o presidente Temer o pressionou para que construísse uma saída no episódio do processo da obra embargada encaminhando o caso à Advocacia-Geral da União (AGU). Segundo Calero, Temer disse a ele que a decisão do Iphan, barrando a construção do prédio, havia criado "dificuldades operacionais" em seu gabinete, já que Geddel se encontrava "bastante irritado".
Encontro
Calero afirmou à PF que a conversa com Temer ocorreu no Palácio do Planalto no dia 17, véspera de seu pedido de demissão. Ainda segundo o ex-ministro, o presidente lhe disse que a chefe da AGU, Grace Mendonça, teria uma "solução" para o caso. No fim da conversa, Temer disse que a política tinha dessas coisas, esse tipo de pressão.
O ex-ministro contou ter ficado surpreso porque um dia antes, em jantar no Palácio da Alvorada, Temer disse a ele para ficar tranquilo porque, caso Geddel o procurasse, afirmaria que não seria possível atender ao seu pedido por razões técnicas.
No outro dia, porém, o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, telefonou para Calero, de acordo com o depoimento. Padilha perguntou como Geddel poderia recorrer da decisão do Iphan. O então ministro explicou como funcionavam os recursos.
Em nota publicada ontem, Padilha, admitiu ter procurado o ex-ministro da Cultura para tratar o imbróglio. Segundo o ministro da Casa Civil, na conversa ele sugeriu a Calero que buscasse uma solução ao impasse junto à AGU. Padilha destacou que Calero "ignorou a sugestão".
Convocação
Uma reunião de emergência foi convocada ontem à noite, comandada por Temer para tentar encontrar formas de reagir às acusações de Calero. O assunto trouxe uma nova preocupação ao Planalto, principalmente porque teriam chegado informações ao governo de que Calero teria gravado a segunda audiência que teve com Temer. O arquivo teria sido entregue à Polícia Federal durante o depoimento.
O Planalto está convencido de que Calero tem pretensões políticas e que agiu, premeditada e devidamente orientado, ao retornar ao gabinete de Temer, pela segunda vez, no mesmo dia, desta vez com um gravador. A reportagem não localizou o ex-ministro.
O presidente Michel Temer escalou o porta-voz Alexandre Parola para dar explicações sobre a suposta "enquadrada" denunciada por Calero e rechaçou qualquer irregularidade no caso. "O presidente trata todos seus ministros como iguais. E jamais induziu algum deles a tomar decisão que ferisse normas internas ou suas convicções. Assim procedeu em relação ao ex-ministro da Cultura, que corretamente relatou estes fatos em entrevistas concedidas", disse o porta-voz, ressaltando que "é a mais pura verdade que o presidente Michel Temer tentou demover o ex-ministro de seu pedido de demissão e elogiou seu trabalho à frente da Pasta".
Impeachment
A oposição na Câmara disse na noite de ontem que o depoimento de Marcelo Calero à PF é caso para impeachment. O vice-líder do PT, deputado Paulo Pimenta (RS), vê desvio de finalidade, uso do cargo de presidente da República para objetivos privados e crime de responsabilidade. "Isso é passível de impeachment", declarou.
O vice-líder da bancada do PMDB, Carlos Marun (MS), disse não acreditar que os fatos tenham ocorrido da forma como foram expostas por Calero e que ele não merece crédito. "Trata-se de um homem magoado e a mágoa está o fazendo ter uma reação raivosa", concluiu, classificando a hipótese de impeachment como "loucura".
Fonte:DN
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